Às vezes, as coisas doem em mim sem que eu as vivencie realmente. Basta saber delas, que eu sinto uma dor. Mas não é uma dor de morte, é, antes, uma dor de vida, quando reconheço minha existênciaem outras existências. E chamo de dor só o instante primeiro, o susto. Logo depois vira outra coisa, uma emoção, um assombro, uma paz, um silêncio. E tudo recomeça...uma dor, uma emoção, um assombro, uma paz, um silêncio...Isso tudo sou eu. Cuidado: não sou a dor. Inevitavelmente passo por ela. Mas necessariamente a ultrapasso. Acho que sou a tranquilidade depois da dor, e só deixo que as dores me cheguem imensas, a princípio, a fim de que me venha em seguida, maior ainda, mais larga e cheia, a tranquilidade.
(Escrevi isto em julho de 1992)